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Crônica #117 | Sem pressa, sem pressão!

Passos e descompassos: desafiando a urgência do tempo.


capa da Crônica #117 | Sem pressa, sem pressão!
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O que você encontrará nesta crônica:


"Qual é o ritmo de seus dias? Você se deixa consumir pela corrida contra o tempo ou já percebeu que a vida é uma linha a ser percorrida, um compasso a ser dançado entre passos e descompassos? Nessa pressa que define nossos dias, Saramago (escritor português) sabiamente nos desafia: “Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo.” A urgência nos arrasta, mas a inação também é um desperdício. Portanto, podemos tentar, por alguns minutos, escapar da pressa e da pressão, permitindo-nos fazer uma pausa equilibrada e verdadeira neste momento. Afinal, para onde tanta pressa nos tem levado?"


 


I. A urgência na vida moderna.


Eu me encontrava em um desses dias de muita pressa, onde cada minuto parecia já ter um destino traçado. O mundo, em sua insistente pressa, nos empurra para um ritmo insustentável, como se o próprio curso da vida exigisse mais de nós do que podemos dar. Então, parece que a urgência se estampa em todos os lugares: no relógio, que acelera sua marcha; nas tarefas que se acumulam como ondas intransponíveis; nas mensagens que chegam em cascata, nos sobrecarregando. Essas urgências externas são visíveis, palpáveis e inegáveis. Mas o que dizer da pressa que, sem perceber, carregamos dentro de nós? E, muitas vezes, não é aquela que vem dos prazos a cumprir, mas de algo mais profundo e misterioso, uma urgência interna, invisível e desconhecida?

 

Imerso nos pensamentos, aguardava o semáforo fechar em uma movimentada rua de São Paulo, quando me deparei com uma simpática senhora. Sete décadas bem vividas, e que vida! Usava um vestido florido e um chapéu de pano delicadamente confeccionado.  No seu braço esquerdo, trazia um punhado de pano de chão e toalhas para vender. O “estoque” era guardado num carrinho de feira, encostado perto da porta onde costumo tomar meu café.

 

Durante o sinal aberto, ela se sentou perto de mim em uma cadeira gentilmente cedida pelo dono do bar.


- “Bom dia, Dona Rosa. Vendeu muito hoje?” Ela sorriu, aceitando o café e o pão com manteiga que lhe ofereci, e respondeu com uma serenidade que pareceu mudar o ritmo ao nosso redor.


- “Gosto de conversar com as pessoas, sou uma terapeuta de trinta segundos!” – disse, abrindo ainda mais o seu sorriso. E, nesse breve intervalo da troca de fases do semáforo, me peguei refletindo sobre o quanto o que ela disse era cheio de vida.

 

Dona Rosa não falou de contas ou de lucros daquele momento. Não se queixou das pessoas apressadas, que mal lhe dirigiam um bom dia, do cansaço ou do tempo nublado, típico de uma manhã paulistana com garoa fina. Sua verdadeira intenção, além da necessidade de sustento, parecia ser outra: ela buscava também algo imensurável, que não se mede nem se compra: a relação humana.

 

Mas como podemos oferecer presença quando tudo ao redor exige pressa?


Como olhar nos olhos de alguém sem pensar na próxima tarefa da lista?


As relações humanas sofrem no meio dessas corridas. Tornamo-nos reféns de um tempo que nunca é suficiente, refletido em cada encontro adiado, em cada conversa apressada e em cada abraço que deixamos de dar pelo nosso tempo corrido.

 

Aos poucos, quase sem perceber, vamos sofrendo o profundo impacto, perdendo o bem-estar, as conexões e, por que não dizer, perdendo a nós mesmos. Nem percebemos quando começamos a medir o valor do dia pelo tanto que fizemos, e não pelo quanto realmente vivemos. 


Enquanto conversávamos, percebi nela uma presença plena e um respeito raro, quase esquecido neste mundo. Respeito, afinal, é a base invisível e poderosa que sustenta quem somos e dá sentido à vida. E, naquele frio cruzamento da metrópole, aquela senhora me ensinava mais sobre isso do que qualquer outra pessoa.


 


Il. Hoje é seu dia de alegria!


Nem todos retribuíam o seu gesto, é verdade.


Alguns olhares seguiam retos, sem qualquer pausa; outros desviavam, e para muitos ela era simplesmente invisível. Alguns fechavam os vidros, outros paravam um pouco antes, e havia ainda os que a olhavam com pena. Mas isso não a incomodava. Com o olhar firme e uma energia inabalável, ela exclamava para cada um que passava uma frase que, de tão simples, soava como uma poesia despercebida: “Bom dia, hoje é seu dia de alegria!”

 

Dona Rosa parecia ganhar vida nesses encontros; era daquelas figuras que pareciam carregar um sol dentro de si. Irradiava, então, um carinho capaz de transformar o espaço ao seu redor, tornando-o mais humano. Era como se o gesto de doar aquela alegria fosse suficiente para mantê-la viva. E talvez fosse mesmo.

 

Dona Rosa era uma ilha de calma em meio ao oceano de urgências, entre passos apressados e buzinas que teimavam em lembrar que o mundo nunca para.

 

Mas a pressa... Ah, a pressa!


A maioria, para não dizer todos, não tinha tempo; tinha pressa, que parecia dominar. Éramos todos, exceto ela, arrastados por um turbilhão invisível, correndo para cumprir tarefas. Por fora, correndo de um compromisso a outro; por dentro, correndo atrás de algo que, muitas vezes, nem sabemos nomear. Um verdadeiro contraste acaba se revelando, pois vemos que o corpo segue apressado, mas a mente, em segredo, deseja fugir, respirar, fazer uma pausa. Em meio ao barulho incessante, atender a esse chamado pela necessidade de desacelerar parece impossível. E a dificuldade de frear não vem apenas do mundo externo, mas também da pressão interna, que nunca silencia.


 


lll. Pressa ou pressão?


Você já percebeu como estamos sempre apressados em tudo o que fazemos? Para onde tanta urgência nos leva? Será a pressa uma escolha nossa ou estamos apenas carregando o peso de uma pressão imposta, que nem sempre enxergamos, mas sentimos em cada movimento?

 

Vivemos com pressa ou sob pressão?


Muitas vezes, nem conseguimos distinguir. Seguimos o dia atropelando momentos, movidos por tarefas que parecem urgentes, enquanto o tempo, sempre à frente, nos desafia a alcançá-lo numa busca incessante por algo que nunca chega. E assim, o coração, como que preso ao ritmo do relógio, acelera ofegante. Nem percebemos quem define esse ritmo ou o que é realmente urgente e o que pode esperar.

 

Nessa atmosfera apressada, a pressão invisível está em todos os cantos: no trabalho que exige resultados imediatos, na sociedade que cobra sucesso ininterrupto, nos próprios sonhos que, muitas vezes, se transformam em pesadelos porque nunca parecem ser suficientes. E assim, nós mal descansamos, comemos correndo, falamos correndo, vivemos sem tempo sequer para respirar adequadamente. Atropelamo-nos sem perceber o peso dessa pressa incessante, sem notar o que estamos perdendo pelo caminho, pois ela nos rouba os detalhes. De repente, é como se carregássemos o peso do mundo nos ombros, tentando provar algo que nem sabemos ao certo o que é, para quem ou por quê.

 

Quantas vezes adiamos a pausa, o descanso, o simples prazer de existir, esquecendo de cuidar de nós mesmos?

 

Parece que viver sob pressão se tornou uma regra no mundo moderno, como se desacelerar fosse um crime, uma fraqueza, ou um luxo para quem não quer vencer na vida. Mas vencer o quê, exatamente?

 

Será que corremos tanto por causa do tempo ou é o próprio tempo que nos empurra para essa corrida sem fim? Talvez a pressa venha de algo mais profundo, e não apenas dos ponteiros do relógio. Quem sabe um medo disfarçado? Medo de ficar para trás, de não sermos suficientes, de falharmos. Um medo travestido de urgência, que nos faz correr atrás de tudo sem ao menos perguntar: “O que, afinal, estamos perseguindo?”

 

A pressão é tão grande que nem temos tempo para refletir sobre o destino dessa corrida. Será que estamos indo na direção certa? Será que vale a pena? Ou somos apenas marionetes de um tempo que nunca espera?

 

Enquanto isso, Dona Rosa permanecia ali, resistente. Talvez não tivesse pressa porque já sabia o que realmente importa. Talvez tivesse descoberto que o mundo não desmorona se pararmos por uns instantes para desejar, mesmo a um estranho: “Bom dia, hoje é seu dia de alegria!”


 


lV. Dar tempo ao tempo.


O mundo não vai desacelerar por nós; por isso, aprender a pausar no meio do caos torna-se um desafio essencial. Escutar a nós mesmos, identificando o que realmente importa em meio à barulheira incessante, é um passo necessário para compreender que não precisamos, necessariamente, acompanhar esse ritmo do mundo. Afinal, no fundo, o mais importante talvez não seja buscar mais tempo, mas sim carregar menos peso – e, com isso, viver com menos pressa e menos pressão. A resposta pode residir em algo simples, porém amplamente esquecido diante das atitudes egocêntricas que predominam atualmente: dar tempo ao tempo.

 

“Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu.” (Eclesiastes 3:1).

 

Parei por um instante e olhei ao redor.

Vi o quanto a pressa dominava tudo, mas meu coração, naquele breve momento, tentava outra coisa: exercitava-se na busca de ouvir o silêncio, na busca de sentir aquele instante.

 

Se percebermos que a vida não é feita só de urgências, mas também dessas pequenas pausas, podemos, nessa percepção, recuperar algo essencial: a humanidade que tantas vezes perdemos na correria.


E talvez seja hora de perguntar: o que realmente nos pressiona? O relógio, o medo, o mundo? Talvez sejamos reféns das expectativas que nós mesmos criamos e carregamos sozinhos.

 

Se não soltarmos essa carga invisível, corremos o risco de nos perder de nós mesmos, deixando a vida se reduzir em uma sucessão de urgências sem propósito. Talvez a pressão que sentimos seja apenas uma sombra projetada pelos nossos próprios medos. Quem sabe, podemos reescrever essa história, convertendo a pressa em presença, e a pressão em liberdade. E foi com esse pensamento que sorri ao me despedir daquela simpática senhora, que, em sua terapia de trinta segundos, me tocou de forma especial.

  

“Hoje é meu dia de alegria!”

 

E eu parti, contagiado pela sua autêntica e espontânea alegria, preenchido pela certeza de que, muitas vezes, é na simplicidade que encontramos o essencial da vida, onde a humanidade pode ser medida pela autenticidade com que tocamos o outro.

 

Como Dona Rosa, podemos espalhar presença e semear pausas, pois esses pequenos gestos, no caos da vida moderna, podem nos resgatar a tempo de percebermos que viver não é apenas chegar ao destino; é sentir o caminho, sem pressa e sem pressão.


 


 

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Esta é uma obra editada sob aspectos do cotidiano, retratando questões comuns do nosso dia a dia. A crônica não tem como objetivo trazer verdades absolutas, e sim reflexões para nossas questões humanas.


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